No âmbito do Programa Caminhos Amefricanos, a Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) deu inicio ao IV Seminário Internacional Caminhos Amefricanos, esta quarta-feira, 4 de dezembro, no auditório 101 do Campus do Palmarejo Grande, um evento que simboliza o fortalecimento da cooperação Sul-Sul e da ligação histórica e cultural entre o Brasil e Cabo Verde. O programa reúne professores, investigadores e estudantes, tem como objetivo potenciar o conhecimento sobre questões africanas em ambos os países, combatendo desigualdades raciais e sociais que persistem como legado colonial.
A Pró-Reitora para as áreas de Política Estudantil, Social e Extensão da Uni-CV, Fátima Fernandes, destacou a importância deste intercâmbio para aproximar as novas gerações das realidades históricas e culturais que unem Cabo Verde e Brasil. "A senitude, do ponto de vista da história, começa pela trajetória que os primeiros habitantes de Cabo Verde fizeram para chegar ao Brasil, constituindo aí o palco de uma mestiçagem extremamente rica", afirmou, acrescentando que "decorrente disso, encontramos todo o manancial geográfico, identitário e cultural que estes dois países traçaram e vêm consolidando ao longo dos tempos, particularmente neste encontro académico que se realiza no quadro de um intercâmbio entre professores, investigadores e estudantes."
O programa visa empoderar e potencializar o conhecimento sobre as questões de África nos dois países, promovendo uma atitude mais proativa e positiva na luta contra as desigualdades raciais e sociais. "Durante muito tempo, o colonialismo potenciou comportamentos e atitudes que estabeleceram diferenças sociais, considerando a população negra como de menor valor", salientou a professora. "Este intercâmbio procura que as novas gerações tenham uma postura diferente, combatendo preconceitos que ainda se veiculam em comportamentos atuais."
Brasil reforça compromisso com educação antirracista
O Diretor de Políticas de combate e superação do racismo do Brasil, Luiz Paulo Bastos, destacou a oportunidade que este intercâmbio representa para os estudantes brasileiros na implementação da Lei 10.639, que torna obrigatório o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas. "Estarmos em Cabo Verde é uma grande oportunidade para continuarmos a implementar a Lei 10.639", afirmou. "Os nossos estudantes, ao conhecerem a realidade cabo-verdiana, poderão, no futuro, aplicar este conhecimento nas salas de aula, contribuindo para o combate ao racismo a partir da educação."
Bastos enfatizou que esta iniciativa une os nossos países e fortalece uma relação baseada numa perspetiva política do sul global. "Isto permite que construamos uma nova sociedade a nível mundial para combater o racismo, considerando-o como um fenómeno global", acrescentou. "Fortalece a perspetiva racial e possibilita uma lógica contranegemónica, não determinada por uma perspetiva eurocêntrica."
Programa Caminhos Amefricanos promove formação de docentes
A Coordenação-geral de Justiça Racial e Combate ao Racismo, Katia Regis, explicou que a iniciativa surgiu para superar desafios na formação inicial e continuada de docentes no Brasil, em consonância com a Lei 10.639. "No Brasil, temos a Lei 10.639 de 2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana", referiu. "Um dos grandes desafios é a formação de professores. O programa visa contribuir para que docentes e futuros docentes conheçam países africanos, latino-americanos e afro-caribenhos a partir dos seus próprios países, conhecendo a história, cultura, desafios e potencialidades, dialogando com estes países."
Katia Regis salientou que Brasil e Cabo Verde partilham experiências comuns, como o passado de colonização e as lutas por sociedades mais igualitárias. "No caso do Brasil, um dos grandes temas para alcançarmos a igualdade é que possamos ter plenamente a igualdade racial", enfatizou.
A conferência inaugural, intitulada "Conexões Amefricanas: Histórias e Desafios Contemporâneos entre Brasil e Cabo Verde", foi proferida pela Professora Fátima Fernandes, com mediação do docente e investigador da Faculdade de Educação e Desporto da Uni-CV, Osvaldino Monteiro.
Na sua intervenção, a professora enfatizou a importância de trazer para o debate os autores que, ao longo da história, têm abordado estas temáticas, especialmente nos países africanos de língua portuguesa.
"Encontramos nos textos literários uma enorme riqueza de situações em que se coloca esta desigualdade, traçando-se as características culturais de África e o caminho que os escravos desenharam, defendendo a cultura e a identidade africanas pelos lugares por onde passaram", explicou. "Não estamos a falar apenas de África e América, mas de todos os continentes por onde o colonialismo passou, incluindo a Europa, onde escritores de língua portuguesa, como Amílcar Cabral e Francisco José Tenreiro, deixaram o seu legado."
A professora abordou também questões como o racismo, a quebra das identidades e o preconceito relativamente às línguas maternas, temas que serão aprofundados ao longo do intercâmbio.
Durante o seminário, que decorre até ao dia 13 de dezembro, os participantes terão a oportunidade de participar em diversas atividades, incluindo mesas-redondas, oficinas, visitas a locais históricos e culturais, e workshops temáticos. Trata-se de um esforço contínuo para internacionalizar a educação, promovendo um diálogo intercultural que fomente a compreensão mútua, combatendo atitudes racistas e reforçando laços históricos e culturais.